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16/06/2014

O palestrante e o infoproduto

Minha última postagem “O palestrante e o seminário virtual” causou um salto nas estatísticas de visitas deste blog e também gerou críticas do tipo “sabe de nada, inocente”, “não sei em que mundo você vive”, “você fez como o Sr. Arnaldo Jabor, quando comentou de algo que não tinha conhecimento” ou “aconselho a você se atualizar sobre o que anda acontecendo”. Ao levantar dúvidas quanto à viabilidade de seminários virtuais como negócio, fui comparado ao “dono da HP, que disse que ninguém iria querer um computador pessoal” (na verdade quem disse isso foi Ken Olsen, fundador da Digital Equipment Corporation que foi adquirida mais tarde pela Compaq).



Outro comentário, emanando um fervor quase religioso, mencionava pessoas que teriam faturado 1 milhão de dólares em um ano, outras que teriam chegaram a 15 milhões no ano ensinando tênis online, e um vendedor de infoprodutos que teria faturado mais de 10 milhões de reais no ano passado. O mesmo que apresentou tantos casos milionários não deu sequer um link ou referência para satisfazer minha curiosidade, mas apenas terminou dizendo: “Não espero que acredite em mim, na verdade nem peço que investigue ou mude de opinião”.

Bem, a princípio não acreditei, mas também não segui seu conselho e saí em busca de mais informação, investigando o tema em sites brasileiros e estrangeiros. Infelizmente tudo o que encontrei foram sites do tipo “Fique rico trabalhando na Internet” nos quais não faltam testemunhos de novos milionários que ganharam muito vendendo... cursos de como ficar rico trabalhando na Internet! Os testemunhos nesses sites me fazem lembrar os programas de rádio e TV desses mercenários da fé. Ainda estou para ver algum negócio viável que não cheire a oportunismo como as famosas “pirâmides financeiras” que viraram febre recente até seus empresários começarem a fugir com o dinheiro ou serem presos.

Alguém afirmou que pessoas com autoridade e respeitabilidade em determinadas áreas poderiam ser bem sucedidas vendendo um infoproduto. Bem, isso eu mesmo disse em meu artigo quando dei o exemplo do Warren Buffett. Não é de hoje que empresas de previsão do tempo vendem versões sofisticadas de suas previsões para quem investe no mercado de futuros ou para empresas do agronegócio, e muitos consultores utilizam ferramentas de aconselhamento online para reduzir os custos da consultoria.

Mas mesmo pessoas com tal autoridade podem dar com os burros n'água ao se aventurarem na Internet com um modelo que funcionava antes. Sei de um palestrante que até o início da Internet mantinha um boletim que era enviado por fax a assinantes pagos. Havia boletins assim por fax também de "gurus" de investimentos, fazedores de horóscopos personalizados e outros. Mas a abundância de informação fácil na rede matou muitos desses boletins, apesar de seus autores terem tentado fazer a transição do fax para o e-mail ou para sites.

Lembro-me de ter feito inscrição em um curso online de um grande site que promove eventos internacionais e presenciais com palestrantes de renome e fiquei decepcionado. O curso não passava de uma apresentação em Flash com um mínimo de informação que eu teria encontrado em qualquer livro do mesmo autor a um custo muito menor. Também me inscrevi em um curso pago de pós-graduação de educação a distância em uma universidade federal e acabei perdendo o interesse. Boa parte da informação que me passavam era comum e de graça na Web. A interatividade prometida também era muito inferior àquela que eu costumava ter em listas e fóruns de debates na Web com especialistas do Brasil e exterior.

Minha intenção ao falar do assunto aqui é para alertar palestrantes e outros profissionais do conhecimento a executarem um bom plano de negócio antes de se aventurarem em um empreendimento no campo dos infoprodutos. Eu era diretor de comunicação e marketing de uma empresa pioneira de TI quando aconteceu o primeiro grande estouro da bolha de Internet, e meu primeiro livro publicado em 2001 (“Crônicas de uma Internet de verão”) fala do assunto. Hoje uma geração que não viveu aquela época fala de “infoproduto” como se fosse a descoberta da pólvora, mas não creio que seja tudo isso.

Infoproduto não é novidade e eu mesmo tenho uma certa experiência no assunto, tanto teórica quanto prática. No passado eles se chamavam de "cursos por correspondência" e a diferença é que eram disponibilizados pelo correio. Na minha adolescência cheguei a fazer um curso de desenho artístico pelo “Instituto Universal Brasileiro” e me ajudou bastante. Na época aquela era a única alternativa para se aprender desenho sem comprar livros (o que não era fácil de se encontrar numa cidade de interior) ou frequentar uma escola.

Se existe autoridade hoje para falar de infoproduto creio que seriam esses arcanos dos cursos por correspondência do passado, que obviamente teriam migrado seus "infoprodutos" para a Web. Será que o fizeram? Descobri que o “Instituto Universal Brasileiro” não acompanhou a evolução e hoje é apenas uma fração do que foi no passado. O “Instituto Monitor” e o “Instituto Padre Reus”, que formaram milhares de profissionais, também continuam existindo, mas não sei como são em termos de negócio. Pelos sites dessas empresas a impressão que dá é que teriam parado sua evolução na era da fita VHS e do CD ou DVD, não chegando a ingressar na Web. Teria sido fácil converter seus cursos para a Web e sair na frente no mercado de "infoprodutos", mas por que será que não o fizeram? A minha opinião é que trombaram na abundância do grátis, como os que são oferecidos em sites como “Super Cursos Gratuitos” ou “Cursos Grátis”.

Acredito que outro grande obstáculo para que os antigos cursos por correspondência avançassem no modelo Web tenha sido o crescimento de organizações como SESI, SENAI, SEBRAE e SENAC que têm expandido seus cursos no ambiente virtual. Alguns são grátis, outros são pagos a preços irrisórios e, considerando a megaestrutura dessas organizações, eu não me aventuraria a competir com elas, a menos que oferecesse algo que elas efetivamente não têm.

Eu disse que tenho experiência com infoprodutos e é verdade, pois afinal de contas uma das variantes dos infoprodutos são os e-books. Tenho hoje nove e-books sobre marketing, comunicação, carreira etc. sendo vendidos na Web e mais uns dez sendo distribuídos de graça (estes são comentários sobre a Bíblia). Quanto ganho com os vendidos? Apesar de meu nome ter alguma projeção na Web, o resultado da venda desses e-books é irrisório. Investi nisso quando ainda não sabia aonde iria dar, mas hoje não me preocupo mais em esperar tirar água dessa pedra porque me conscientizei de que meus e-books são um instrumento para criar notoriedade e vender minhas palestras. Você acredita que ganho mais com a participação na publicidade de meus vídeos da TV Barbante com o AdSense do Youtube?

Mas minha experiência em infoprodutos não se limita aos e-books. Também tenho experiência no desenvolvimento de um infoproduto voltado ao ensino. Em 2002 fui contratado por uma empresa de ensino a distância especializada no mercado médico. Seus cursos eram voltados para médicos e me contrataram porque queriam expandir o catálogo oferecendo algo para recepcionistas de consultórios. Na época o vídeo na Internet ainda era coisa do futuro (o Youtube começou no final de 2005), por isso o curso que desenvolvi, ajudado pela jornalista e administradora hospitalar Fernanda do Coutto Riberti e por minha filha formada em enfermagem Lia Persona Hadley, era distribuído em CDs para computado.

Os CDs traziam 8 vídeos introdutórios, 40 áudios de uma radionovela cômico-educativa gravada por atores e atrizes profissionais, além de 40 lições em texto, acompanhadas de questionários e atividades interativas. As lições eram destravadas e disponibilizadas à medida que o aluno terminava as etapas, cujo acompanhamento e avaliação eram pela Internet. O projeto previa que tudo migrasse para a Web quando existissem condições técnicas para isso.

Pouco tempo depois de terem publicado o piloto de meu curso de atendimento em consultórios médicos a empresa faliu. Como eu sabia que não iria receber um centavo por meu trabalho fiz um acordo para anular o contrato e receber de volta os direitos sobre o curso. Durante uns dez anos tentei de várias maneiras lançar o curso, ou por conta própria ou oferecendo o material a outras empresas, mas acabei desistindo. Não é um mercado fácil, como já disse. Acabei transformando o curso em um livro que é vendido em e-book e impresso com o título “Laura Loft - Diário de uma recepcionista”.

Também em e-book na iTunes

Os vídeos de introdução dos módulos você encontra no Youtube, mas os áudios da radionovela eu não pude divulgar porque os atores não deram permissão. Apesar de terem sido gravados com script de minha autoria, os direitos de voz pertencem a deles. Mas meu investimento em tempo e fosfato não foi em vão. Além do livro, boa parte do know-how que adquiri pesquisando e escrevendo o curso acabei transformando em um curso presencial de atendimento em consultório e acabei ganhando mais neste formato do que teria ganho com a versão web, apesar de vendê-lo apenas para turmas fechadas de empresas.

A experiência adquirida em 2002 no desenvolvimento de um infoproduto, com o acompanhamento de todo o processo de pesquisa, criação, produção, marketing e distribuição, me deixou bastante cético em relação a "infoprodutos". Não é um mercado impossível mas também não é um mercado fácil como tentam mostrar os vendedores de sonhos. Ainda não encontrei um que esteja dando certo, pelo menos do porte de um empreendedor individual como é um consultor ou palestrante. Se você tem uma marca a zelar (lembre-se de que a marca do palestrante ou consultor é seu nome) sugiro que tome cuidado antes de seguir o modelo desses vendedores de sonhos de riquezas do tipo “Fique rico dormindo”, ou de métodos miraculosos do tipo “Emagreça comendo”. Amanhã seu nome poderá ficar queimado, quando um batalhão de descontentes começar a reclamar nas redes sociais.

Obviamente sempre existirão os infoprodutos sérios, vendidos por universidades de renome e organizações profissionalizantes, mas boa parte deles é subsidiada ou aproveita o nome, a infraestrutura e os cérebros da universidade, algo que um empreendedor pigmeu como eu não teria à disposição.

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